Folha da Manhã, Campos dos Goytacazes, 11 de novembro de 2020

Chiclete viral

Edgar Vianna de Andrade

            Em 1988, “A bolha” foi refilmada. Trinta anos é um tempo longo na arte cinematográfica. A técnica do stop motion ainda era usada mais por virtuosismo que por necessidade. Os efeitos especiais computadorizados avançaram bastante. A bolha espacial de 1958 passa agora a se chamar “A bolha assassina”. A direção coube a Chuck Russel, experiente cineasta de filmes redundantes. Estamos no último ano da Guerra Fria, embora não se soubesse que, em 1989, o bloco soviético começaria a ruir com a queda do Muro de Berlin. No filme, uma nova guerra com armas nucelares ainda pairava como ameaça à segurança do mundo.

            O filme muda de tom. A bolha que vem do espaço sai primeiro da Terra. Ela não é mais passageira de um asteroide, mas fruto de uma experiência militar para a produção de armas biológicas. A bolha é um vírus que cresceu e se tornou visível a olho nu. Não sei se, na atual pandemia, seria bom ver o novo Corona vírus. O herói também não é mais um bom garoto, mas um bad boy.

            No mais, o enredo segue o sucesso de “A bolha”, de 1958. O rapaz pobre e evitado pelos colegas de escola encontra um velho homem que viu uma estrela cadente e foi examinar o lugar onde caiu. No seu interior havia uma gosma que grudou em sua mão. Ele corre desesperado e é atropelado por um casal. A moça será a amada do bad boy. Assim que devora o velho, a bolha absorve o namorado da moça.

            Militares e cientistas com roupas protetoras da cabeça aos pés, varrem o local atrás da experiência militar. O comando está com um cientista negro frio e impiedoso. Seu ânimo é o de eliminar todos os habitantes da pequena cidade do interior. Todos eles são dispensáveis diante de um experimento que pode colocar os Estados Unidos em notável vantagem em relação à União Soviética. Não se invocam razões de Estado, mas sim a maldade. O cientista e os Estados Unidos são maus. Os que cercam o velhinho negro ainda manifestam compaixão pelos humanos.

            E os maus devem ser castigados. Os bons também. Além de vários moradores da cidade, perfeitamente dispensáveis como artistas, a bolha devora uma criança, suga um homem avantajado pelo cano da pia, pratica mortes bizarras. Ela parece ser conscientemente má. Entra no cinema da cidade, que exibe “O massacre da serra-elétrica”, e persegue a todos. Entra na rede de esgoto atrás da mocinha e de dois garotos. O esgoto, em países desenvolvidos, é uma verdadeira piscina para os brasileiros. Dá pra mergulhar e ver o fundo.

            Mas o monstro precisa ser destruído. Como no filme de 1958, ele é sensível ao frio. Nada melhor do que um banho de neve artificial. É curioso como gosmas foram aproveitadas no cinema. Em 1985, três anos antes de “A bolha assassina”, “A coisa” também explorava pastas grudentas. Nenhuma, porém, foi mais pegajosa que “Seres rastejantes”, de 2006.

            Mas o exagero de “A bolha assassina” não tem o frescor juvenil e bem-humorado de “A bolha”. Num arroubo de previsão, o reverendo que acreditou ser a bolha um castigo de Deus, foi atacado por ela e escapou. Da bolha, ele conservou um fragmento num vidro para uso futuro. Era o gancho para uma franquia que não aconteceu, mas nunca se sabe.



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