O VÍRUS DO TERROR
Folha da Manhã, Campos dos
Goytacazes, 18 de fevereiro de 2020
(DOIS MATEUSINHOS)
O grito
O vírus do terror
Edgar Viana de Andrade
No momento em que um surto virótico
eclode na China de forma preocupante para o mundo, Nicolas Pesce empenha-se em
dirigir mais uma refilmagem de “O grito”, que começou em 2002 com o diretor
japonês Takashi Shimizu. Qual a semelhança entre o surto de coronavírus – agora
com o nome oficial de “Covid-19” – e o espírito (para entrar no clima do filme)
da franquia? O “Covid-19” aterroriza o natural, pois pode ser comprovado pela
ciência de que existe, propaga-se entre as pessoas e pode matar muitas delas num
mundo globalizado, enquanto que o cerne da franquia não deixa de ser um vírus
que não pode ser visto no mais potente microscópio eletrônico. Quando uma
pessoa morre com ódio no coração, seu espírito atormentado contagia os vivos
que com ele têm contato, levando-os à morte e ao contágio de outros vivos.
Não é uma ideia original. George
Romero parece ter sido o primeiro a concebê-la quando lançou “A noite dos
mortos-vivos”, em 1968. Ele não só inaugurou o medo por contágio físico, como
também mudou o paradigma do zumbi haitiano. Agora não é mais um morto que se
comporta como vivo. O zumbizismo passa a ser uma doença contagiosa, quer
resultante de micróbio, quer de radiação, quer de poluição.
O paralelismo entre o “Covid-19” e
“O grito” continua, pois uma mulher contrai o ódio de uma alma penada no Japão
e o dissemina nos Estados Unidos. Estará esse detalhe pouco explorado
corroborando a ideia bastante divulgada na história de “Drácula” de que as
doenças e o terror nascem no oriente e se transferem para o ocidente a fim de
causar pavor? Se é assim, podemos remontar essa crença à peste negra, na Idade
Média.
Tendo feito a tentativa de
interpretar o filme pelo lado externo, examinemo-lo pelo lado interno. “O
grito” é mais um filme de terror, com todos os clichês do gênero desenvolvidos
em outros filmes, notadamente os produzidos nos Estados Unidos. Além de uma
pessoa transportar o vírus do terror, estão lá uma grande casa envolta em
sombras, as rodovias desertas, as florestas, as figuras femininas de cabelos
molhados e escorridos (a exemplo da Samara), as aparições repentinas (que
assustam mais pelos ruídos que as acompanham do que por elas mesmas) e a
música, que cria clima para gerar o medo.
As montagens atuais tendem ao
continuísmo sem cortes aparentes, como em “1917”, ou ao excesso de cortes
espaciais e temporais, como em “Adoráveis mulheres”. A edição de “O grito” se
insere na categoria do segundo filme. Com tantos cortes, o roteiro só começa a
ser percebido pelo espectador não familiarizado com a linguagem cinematográfica
do meio para o fim. E o roteiro está a cargo do próprio Nicolas Pesce com a
contribuição de Jeff Buhler. Sam Raimi, mestre do gênero “terror”, está na
produção e Lin Shaye, a heroína da franquia “Sobrenatural”, integra o elenco.
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